domingo, março 22, 2009

Ventanias Soltas


these words I write keep me from total madness

Charles Bukowski


No meu mundo dorme-se em cama de refluxo da maré vaza. Tenho à boca do estômago um psicopata ténue que se passeia pelos lençóis em noites do macabro e quotidiano. Adivinhaste-o no dia em que te contei que me uniria a alguém com a brevidade com que se alivia o fardo de um burro estreloucado. Adivinhaste a Karen em busca de um Denys Finch Hatton sobrevoando uma plantação de café no Quénia. Sem coordenadas, de forma alguma o tinha encontrado. Out of África. Na altura troquei a nossa terra pelo Direito. Pelo arrumar das câmaras dos filmes de acústica resvalada dentro da alma, como quem arruma carros direitinhos à porta de ébrias casas de fado. Fugia a sete pés de um pó de mina débil que assolava uma cabeça doente. A cabeça que me dirigia, valha-nos Deus. E busquei o Drácula que antevi caminhando nos mausoléus de Frida Kahlo, aquela que recebia encomendas de dores vindas do céu. Eu também as recebia, mas vindas do Inferno. Procurava o Anjo da Guarda como Santo António procura noivas nas ruas pombalinas agora rebentadas de carros. As promessas colhidas, às colheradas, dos livros que nos levavam à lua enquanto desfolhava um mil-folhas trazido do café central. Os heróis da Marvel, servidos debaixo da cama, quando alguém espreitava para ver se eu estava a estudar. Estudava na véspera e pronto. Era escusado pedirem-me mais. O Homem-Aranha e o Capitão América, contra os maus, vestiam-me de vida enquanto os Xutos contavam-me histórias no leitor de cassetes. Abraçava as tuas ideias como a invasão das Bombokas lavada com sabão Clarim, para depois as escrevinhar num zoom fotográfico a muitos pixel por segundo. Sim, fui embora na imperfeição, mascando uma pastilha Pirata que engoli e se colou para sempre no meu coração. Fui cedo e a más horas. Diziam as conversas de praia, e as tuas, que casei com quem me levou as letras em carrinhos de feira, num choque tremendo com o ego e o sobrenatural. Casei com quem se auto-denominou de Jesus Cristo e de todos os profetas, num esbanjar de moedas jogadas de um Judas traidor. Sim casei com um bolero bipolar. Em tantas notas como uma pauta de Karajan tocada por palhaços que falam alto e em bom som nas minhas madrugadas a rezar à porta das clínicas de malucos. Quando voltei, a cidade levou-te porque só nela se pode dar asas ao desejo, e nada me ilibou o crime na câmara ontológica de Hitchcok. Amorteci a queda no amor cão, porque só outro amor cão nos eriça a inspiração. Só disso é que me sobra desejo, da burrice saloia de ir atrás e não esperar que venham atrás. Ficou o beijo em livro, a trinca da bela da bolacha americana enquanto eu conto carneiros vermelhos à porta do cinema, na era do colesterol. Parece que passaram mesmo cem anos de solidão e, tirando as palavras da boca de Clarice L., "a minha força está na solidão. Não tenho medo nem de chuvas tempestivas nem de grandes ventanias soltas, pois eu também sou o escuro da noite*”. Lembro-me que me olhaste e naquele ar de sempre autoritário, no bom sentido, antevês-te o futuro real à boca duma Patagónia que se adivinhava a definhar quando eu parasse de escrever. Disseste-me, em poucos segundos de película, quantos anjos eram os negros. E o meu estado futuro e vegetativo a adorar um psicótico egocêntrico. Só não me disseste uma coisa: É que tudo iria ser muito mais desumano, como que um disco riscado dentro da minha cabeça, e “o que verdadeiramente somos é aquilo que o impossível cria em nós*”



*Clarice Lispector



BAR

Hoje sirvo:
COM ÁLCOOL
Drink of Lx

Ingredientes :
Gelo
4 cl vodka de morango
2 cl Bacardi lemon
sumo de limão qb

Método de Preparação :
Num copo com gelo coloca-se aproximadamente 4 cl de vodka de morango, seguidamente 2 cl de bacardi lemon e preenche-se com sumo de limão. Pode colocar-se uma rodela de limão.

SEM ÁLCOOL
Caipirinha Sem Álcool

Ingredientes :
Água Tónica
Açucar Amarelo
1/4 Lima
Sumo de Limão

Método de Preparação :
Macerar bem 1/4 de lima com açucar amarelo, depois juntar 1 dash de sumo de limão, mexer bem, depois de bem mexido juntar a água tónica, acabar de encher o copo com gelo moído.


MÚSICA

Sirvo ainda: Out of África. Para ouvir coloque em pausa o Music Playlist da barra ao lado direito.

domingo, março 08, 2009

Crónica de Filha em Carnavais de Betão e Dias de Cão


Escreve. Seja uma carta, um diário ou umas notas enquanto falas ao telefone, mas escreve. Procura desnudar a tua alma por escrito, ainda que ninguém leia; ou, o que é pior, que alguém acabe lendo o que não querias. O simples acto de escrever ajuda-nos a organizar o pensamento e a ver com mais clareza o que nos rodeia. Um papel e uma caneta fazem milagres, curam dores, consolidam sonhos, levam e trazem a esperança perdida. As palavras têm poder.

Paulo Coelho


Lápis de cor amontoados num mikado colorido. Retiro o suspiro de Carnaval que desceu a Avenida. Achei-o cinzento. Achei-o da cor com que o meu pai me pintou a eterna cobrança da perfeição. Um mal danado de um chove não molha de pressão psicológica. Refrão de angústia que Jobim cala quando o idolatro em mais um transplante de alma falhado. Olhando, dez mil anos antes de Cristo, sem coros de igreja, homens, mulheres e crianças reuniam-se mascarados para espantar os demónios que cortavam os pulsos sobre as suas plantações. Levados para a cama pela fome de jantar posto na terra, eram sorvidos pelos de sangue azul. [Agora é o mesmo]. Não havia jardins. Reservavam-se flores para Babilónia. O corso destinava-se a sobrevivências. A origem do Carnaval é obscura, fez-me crer o patriarca. Dum religioso primitivo pagão que homenageia o, para ele, assustador Ano Novo e algo mais, o ressurgimento da natureza. Fingimento montado em andaime certificado. Será? Edificava-se a exigência e o desconhecimento do mundo. O enjaulamento na escola, o carreiro certo sem desvios, nem para entrar na livraria a cinco tostões de levar uma tareia do Rei Momo. Um dia a professora primária carimbou-me o A4 com o “X” e um xaile carnavalesco para que eu desce-se nele, e em linha de vida, um algeroz de canetas de feltro. Agarrei num lápis cor de burro e zumba fiz desaparecer o manto, sei porquê. A alma, num antónimo provocado, traía-me. Companheira de guerra dos meninos, em confettis desbotados, carimbou-me a régua as falanges e as falangetas de dor. Nestas horas desejava ter mãos de tesoura e cortar a minha paixão louca por sorrir um pouco. Gostava de rir, mas a expressão folia dos lábios era abalroada em papel de parede claustrofóbico de um quarto de poucos metros quadrados que usava para fugir. Na rádio local espevitava-se a esperteza saloia e em reclames da época avivava-se o Pierrô de traços andróginos e anjo do bem. Via Columbinas de Veneza, [vejo Columbinas bailarinas fúteis,] simbolizando a Terra equinocial em dias de amores ilícitos. E o tentador Arlequim italiano de desejos e tentações realizados na protecção do anonimato das máscaras. Estranha forma de vida*. Num bluff predador, não me era permitido ter amizades. Proibidas as pulseiras de trapo e linhas. Proibida a televisão, a música, o vídeo, proibidos os posters, os passeios, a praia mesmo à porta. Só me lembro da tabuada decorada para não apanhar. Parecia que andava sempre com um ovo estrelado na cara e os números prontos a serem disparados da boca. Amarela, na catequese, desenhava o único trajecto permitido. Percurso até ao conclave, num Bispo traçado, que também enganou, enquanto o Diabo esfregava o olho. Lés a lés, código do divórcio, apaguei os dias especiais. Nada de dias do pai, dos anos, dos namorados, da mulher. Ficou-me os dias de cão sem chocolates, nem pastilhas, nem amor. Diários medidos a metro e em buracos de balas ainda alojadas e a granel na minha Tucha (a Barbie do meu tempo) das brincadeiras. As serpentinas foram enroladas no homem autoritário que chamei ignorante por conta própria. Pois viver é a coisa mais rara do mundo **. E ontem saí para a rua, cancelei o stand-by, senti-me uma pita de 6 anos no meio do cortejo da terça-feira, feriado facultativo dos corsos e grémios de loucura. E transpus a Directiva carnavalesca do obrigatório sorrir. Continuo a não ter mãos de tesoura, nem tencionei atirar ovos e guaches dos tempos idos, esses ficaram no banco dos réus. Digitei a password que me permitiu a dimensão actual. Correndo o risco de encontrar o Rei Momo, olhei os meninos da escola e da creche descendo a rua principal. No meio daquela gente toda, vi-me e encontrei-me… De sorriso amarelo, uma menina mascarada descia a rua, traje a combinar com as teorias de evolução de Darwin. Em directo para a rádio local, o locutor gritou, depois de dizer o nome da escola: Não posso acreditar! Vai aqui uma princesa... Uma princesa com uma pistola na mão!!!!!!


*Amália Rodrigues
**Oscar Wilde



BAR

Hoje sirvo:

COM ÁLCOOL
Long Drink Flamenco

Ingredientes :
2 doses de Campari
3 cl de Vodka
Espumante
Gelo

Método de Preparação :
Junte o Campari e a Vodka num copo alto, acabe de encher com o espumante e mexa rapidamente com uma colher.


SEM ÁLCOOL
Batido de Abacaxi

Ingredientes :
1 abacaxi
1 lata de leite condensado
2 garrafas de guaraná

Método de Preparação :
Bater tudo no copo de batidos.
Passe por peneira fina.
Servir bem gelado.

MÚSICA

Sirvo ainda: Elis Regina- É com esse que eu vou . Para ouvir coloque em pausa o Music Playlist abaixo.