Cada vez que piso a estrada, o retrovisor seduz-me, faz-me amar e desejar quilómetros de asfalto. A Gata Borralheira, ou será a Cinderela, despoja-se do seu sapato de cristal no DVD esquecido. Os rails, o desapego do silvestre campo e do teu olhar atropelam-me a 90 e complicam o diário escrito com histórias do Charlie Brown e do seu cão atmosférico. Na rádio a Prova Oral da Antena 3, os desafios certeiros do Alvim e os apetecíveis convidados que falam connosco no caminho. Temos companhia mesmo que no pendura não se identifiquem anjos ou fantasmas. Talvez o stop seja só para mim, para que eu deixe o sapatinho de cristal à beira do retrocesso. No tejadilho a alma, as toneladas do primeiro acidente da manhã que é sempre com um pesado. Vem a preocupação, o saber, o querer ver se rolas ainda em pneu energy de baixo atrito e resistente a longas viagens. Resistente aos almoços no chão em frente à lareira e ao meu sonho concretizado de dormir com lenha a chorar e percorrendo a reboque os desejos de cartoons e do Shreck animado. Não sei porque te deu para apareceres ao pé de mim e me perguntares: “E se de repente lhe oferecerem...” e eu à espera das flores num Impulse multicolor à Floribella e aos beijinhos diários e rotineiros. Nada de espectros senhora, nada de pensamentos românticos e toques subtis de cabelo. “E se de repente lhe oferecerem uma viagem de longo curso?” Descarada e espontânea a pergunta como a tua entrada na Livraria Bulhosa aquando do lançamento do Kiss Me onde seduziste a Marilyn Monroe por míseros cêntimos. Depois o livro das casas de madeira em fotos tipo National Geographic e os barquinhos do Campo Grande onde navegaste com a cabeça debaixo da minha saia para me envergonhares. Acho que os patos ainda se riem da minha cara de escândalo pueril de doutora apanhada ao desprevenido pelas regras da pressão baixa e do aumento da resistência, o consumo devastador. Algo que se entranhou num esforço de física e tatuagem. Tu estás em mim assim e como sempre de colher a bater nos dentes depois duma mousse brasileira no Charlot dos Olivais. É ali num canto que sentes a pressão do meu coração a frio como manda o figurino. O coração que perscruta cada manchinha de óleo das tuas mãos de dragão e de dor atenuada pela ausência dum coração teu. No teu peito bate a ferramenta a 340 cavalos dum Scania de cor igual aquela que eu desejava num berço. Depois a espera, a madame apetecia-lhe tomar algo, e tu a dizeres que deixarás a Frize, e de morango, a refrescar no Mar do Norte, um mar a cheirar a nacional, às vezes a internacional. Breakfast in América para variar num subúrbio onde se vê o que nos escondem desde meninos, onde a butterfly dança no bolso a código de rua e de quem é dos nossos. É assim num longo curso que já não sinto, que aumenta a carga, matéria perigosa, com certeza, com losango sinal laranja e preto a condizer. Paro numa área de serviço as batatas fritas deixo a meu lado à espera que as venhas comer numa linha motriz adequada às necessidades. Ou será uns costelinhos no Porto ou a prometida francesinha. Os pauzinhos de batata ficam sempre lá, naquele cartuxo cilíndrico e calórico à espera que Charles Perrault ponha ali uma fada madrinha que dos ditos pauzinhos te faça um coração, um filho, uma casa e o carro mais lindo da freguesia. Tudo sem feitiços de abóboras às badaladas da meia-noite. Tudo por um dia isento de economia operacional e valor residual. Tudo num tractor chamado desejo com honras de cais de Lisboa e bolo alentejano derramado às gaivotas e o maroto chichi rio fora para vincar a rebeldia. Fica-me o barco afundado tal como me encontraste enterrada num jornal de fim-de-semana, ficam-me os aviões da residencial ao lado do aeroporto, fica a moto quatro nas dunas da costa norte, as altas horas da madrugada e a madame Bimbô da Tv. Só queria ter a certeza que a tua mãe tem: que voltas quando te dá na real gana, nem que para isso faças um intercontinental. Já não me importo que não vejas o vestido turquesa que comprei para te encantar. Já não me importo que a Sophia Mello Breyner tenho arrancado a fada madrinha, as irmãs e o príncipe à história da Gata Borralheira. Que Robert Walser lhe tenha acrescentado um rei sandeu, um bobo senhor de espírito e um príncipe que não sabe o que está ali a fazer. Afinal a nossa história é a história da Princesa e do Dragão como tu bem vincaste. Da Princesa que se apaixonou pelo Dragão mas que também perdeu um sapatinho qual Cinderela em busca de um coche, ou será dum camião grande do alcatrão e das horas laboriosas. Há dois anos. Quando dei por isso já era noite das bruxas. Pelo sapatinho passaste à pouco, já passaste tantas vezes. O Snoopy é o seu cão de guarda, surripiei-o ao Charlie Brown das nossas manhãs de domingo. O raio do cão não sorri quando tu passas. Sabes uma coisa? Acho que dentro do sapato já cresceram ervinhas...Hoje sirvo um long drink Butterfly
Ingredientes :
3 cl de vodka
1 cl de mandarine
1 cl de xarope de morango
1 cl de natas
Preparação:
Meter tudo no shaker, servir num copo longo e preencher o copo com limonada.
E já agora...







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